sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O design do cliente

Um designer competente, ou um gabinete de design, não deve fazer o que o cliente quer mas antes projectar aquilo que o cliente ainda não sabe que quer. Só assim a disciplina e a prática do design se justificam. Só assim as competências e o diálogo se podem assumir por inteiro. E só assim, também, o designer prestará o melhor serviço. Um cliente convencido que sabe sempre o que quer — mesmo em áreas em que pouco sabe ou nada aprendeu — só precisa de um técnico que execute; não precisa de contratar um designer. 

Henrique Uva/Herdade da Mingorra apresenta uma imagem interessante no seu vinho M, colheita tardia ou "late harvest". A singularidade da garrafa, afastando-se dos tradicionais modelos estreitos, neste tipo de vinho (de sobremesa ou aperitivo); a delicadeza do nome e do grafismo (questionamos apenas a opção pelo tipo de letra moderno, um tanto amaneirado); a impressão a ouro, à semelhança da cor do vinho; a gargantilha distinta a condizer; a limpeza de informação no rótulo, remetendo-a para os bastidores do contra-rótulo (aqui menos conseguido): fazem do todo uma combinação harmoniosa de coerência, carácter e elegância e, para muitos, será certamente um bom exemplo de originalidade...

Entretanto pode ler-se no blogue da empresa responsável pelo seu design: "O Rótulo Late Harvest (colheita tardia) da Mingorra foi desenvolvido com a grande cumplicidade de Isabel Uva que de uma forma apaixonada defendeu a sua ideia até à conclusão do projecto e no fim, apenas lhe podemos dar os parabéns pela sua visão". Na sequência destas palavras dir-se-á que o primeiro parágrafo deste post perde o seu sentido. Contudo, consultado o portefólio de rótulos desenhados pela "agência de design e comunicação" em causa, constatámos que todos eles evidenciam a falta de carácter e de eloquência que caracteriza a produção nacional, nomeadamente quanto ao uso da tipografia, elemento principal na comunicação de rótulos. Desconhecendo o processo metodológico do projecto, só podemos afirmar que a troca de papéis acabou por funcionar.

Não é um diploma em design que faz um bom profissional de imagem de vinhos. Nem uma carteira de clientes mais ou menos famosos, nem 
um portefólio vasto garantem eloquência. Designers especializados, irrepreensíveis — como em todas as profissões  não abundam.



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